Fazenda prepara cobrança de R$ 180 bi em dívidas

21 de outubro de 2023 às 08:02

A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) vai lançar o projeto 100+, uma força-tarefa para solucionar as cem maiores execuções fiscais do País, processos judiciais por meio dos quais a União cobra débitos dos contribuintes. Hoje, essas ações somam R$ 180 bilhões. Paralelamente, dentro desse esforço arrecadatório, a PGFN está preparando novos editais chamando os devedores para a realização de acordos de transação tributária, estratégia que visa a arrecadar R$ 12 bilhões no próximo ano. Esse montante já está incluído nas projeções da equipe econômica de arrecadação extra para 2024, no esforço de zerar o déficit público.

Os anúncios foram feitos nesta semana pela procuradora-geral da PGFN, Anelize Almeida. Para o advogado tributarista André Abrão, do escritório Araújo Abrão Advogados Associados, a opção da PGFN para cobrar valores devidos e pôr fim a litígios judiciais por meio da transação tributária é uma estratégia inteligente. Ele destaca que essa modalidade segue os princípios do direito que preservam tanto o interesse arrecadatório do Estado quanto o da preservação das empresas. “O erário público consegue viabilizar o recebimento de créditos tributários de difícil recuperação, e as empresas, por sua vez, conseguem viabilizar a continuidade de suas atividades”, pontua o advogado.

Foi o que aconteceu com a indústria pernambucana Cimento Nassau, com quem a PGFN fez o maior acordo de transação tributária da história. A empresa, que está em processo de Recuperação Judicial desde o final do ano passado, fez acordo com o governo federal para liquidar uma dívida tributária com a União que chegava a R$ 11 bilhões. “A transação tributária é o melhor e mais eficaz mecanismo de conciliação de débitos tributários, que possibilita ao devedor buscar descontos, condições de pagamento mais vantajosas para a regularização de sua situação fiscal”, argumenta André Abrão.

Complexidade
De acordo com a chefe da PGFN, dois editais de transação tributária serão abertos até o final deste ano, relacionados à cobrança do PIS e Cofins, tributos de grande complexidade. Um deles tratará da incidência do PIS e Cofins na própria base de cálculo e a outra da inclusão do ISS, que é municipal, na base de cálculo dos dois tributos federais. Ela explicou, em entrevista à Agência Estado, que um dos principais objetivos do órgão é reduzir o chamado contencioso tributário, ou seja, a disputa judicial entre o Estado e o contribuinte, que ultrapassa os R$ 5 trilhões.

“Em um país como o Brasil, com essa desigualdade social que a gente tem, R$ 5 trilhões em contencioso é inviável, é irreal. Está todo mundo pagando essa conta“, justifica Anelize. “As empresas estão pagando porque esse contencioso demora a ser resolvido ou por conta do custo financeiro das garantias. A União paga porque é um ativo que ela não sabe quando vai receber e isso impacta a trajetória dos juros e da dívida pública. E a sociedade, consequentemente, também paga (devido aos efeitos na economia).”

André Abrão acrescenta que desde que a transação foi instituída, em 2020, cerca de R$ 466,6 bilhões em dívidas já foram regularizados. “É um motivo enorme para comemorar, significa que o instituto jurídico está cumprindo com o seu propósito”, analisa. Com essa possibilidade de formalização de novos acordos, inclusive com a publicação de editais por parte da PGFN, ele acredita que serão alcançados volumes muito mais expressivos. Análise destaca ainda que a medida não é apenas arrecadatória, mas também de justiça fiscal: “O objetivo é recuperar créditos que o contribuinte deveria ter pago e não pagou”.

A transação
O instituto jurídico da transação tributária foi estabelecido em Lei (nº 13.988/2020), passando a integrar o Código Tributário Nacional, visando criar e regulamentar meios eficazes para a solução de conflitos tributários. “Assim como o instituto da recuperação judicial, a transação tributária leva em consideração que o segmento das atividades das empresas é mais benéfico para a economia nacional, para o tesouro nacional e para os trabalhadores”, compara o advogado. “A partir dos acordos, a empresa recupera sua capacidade produtiva, mantém e gera novos empregos, ajuda no crescimento econômico do país e gera arrecadação para o Estado”.

Para comprovar, André Abrão lembr que a Cimento Nassau abriu negociações de investimento para extração de calcário em uma jazida aqui em Goiás, o que contribuirá com a efetiva recuperação de suas atividades. 

Lista das 100+
Nessa lista das 100+, que ainda está sendo elaborada, serão consideradas apenas as execuções viáveis de serem cobradas – deixando de lado, por exemplo, empresas que estão falidas há muitos anos. A procuradora-chefe da PGFN pondera que a PGFN não tem a pretensão de ganhar todas as causas, que somam R$ 180 bilhões e envolvem teses tributárias complexas, mas afirma que o Estado precisa resolver e encerrar esses litígios.

Segundo ela, trata-se de um projeto estratégico, de médio e longo prazo. Por esse motivo, nenhum valor referente à iniciativa foi previsto nas metas arrecadatórias de 2024, quando o Ministério da Fazenda prevê elevar a receita federal em R$ 168 bilhões com o objetivo de zerar o rombo nas contas públicas.

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